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Tirar lições da pandemia

A pandemia Covid-19 veio provocar a sensibilidade social e política para a necessidade de se reforçar a cooperação e a colaboração ao nível da saúde a nível mundial e, particularmente, ao nível da União Europeia. Ao mesmo tempo que reiterou a dimensão do fenómeno da globalização, o atual surto pandémico pôs a nu debilidades dos sistemas de saúde europeus.

Hoje, é evidente para todos que, também na saúde, a solução dos nossos problemas não está no tão propalado ‘orgulhosamente sós’ que muitas vezes cingimos à política e à economia, mas antes numa resposta conjunta e integrada. É assim com o ambiente e as alterações climáticas, com as migrações e a atividade economia, tal como é também na ciência e na saúde.

Mas há alertas e verdades que reiteradamente se continua a desvalorizar. Orson Welles evidenciou já no século passado a ‘aldeia global’ em que vivemos, mas a diretora-geral da saúde assumiu publicamente já este ano a sua incredulidade sobre as capacidades do novo coronavírus vir rapidamente da China para Portugal. São erros e falhas que desnudam impreparação e incompetência, com efeitos bem mais lamentáveis na atual fase de descontrolo da propagação do vírus, com particular drama nos lares de idosos.

No mundo desenvolvido da União Europeia há situações com que lidamos diariamente, mas que dificilmente poderíamos compreender ou atribuir-lhe alguma credibilidade, seja por parte da opinião pública em geral, seja até dos decisores públicos. É o caso da dependência total da UE em relação à produção de medicamentos. Ou o facto de não haver informação estruturada sobre as capacidades do sistema de saúde em Portugal, como equipamentos do serviço público de saúde, nomeadamente ventiladores.

O nível de qualidade de vida dos cidadãos da UE não permite descurar as políticas de saúde. Na UE, assiste-se a um esforço redobrado para garantir uma resposta imediata à atual ameaça sobre a saúde e harmonizar as estratégias entre os Estados-Membros. A Covid-19 mostra todos os dias a necessidade de uma melhor cooperação e coordenação entre os países da UE em período de crise, bem como de um reforço da capacidade para responder eficazmente a novas e futuras ameaças sanitárias transfronteiriças.

Ao longo dos último meses, a nível da UE, aprovamos um vasto conjunto de medidas para ajudar as pessoas e as empresas a enfrentar esta crise, como a Iniciativa de Investimento Resposta ao Coronavírus, com 37 mil milhões de euros para apoiar pessoas, regiões e países mais afetados pela pandemia. Inclui-se ainda o alargamento do Fundo de Solidariedade da EU – com 800 milhões de euros para este ano –, a flexibilidade máxima para canalizar os fundos estruturais da UE ainda não utilizados, o reforço do apoio aos pescadores, aquicultores e produtores agroalimentares, a continuidade do Fundo de Auxílio Europeu às Pessoas Mais Carenciadas, a mobilização de mais de 3 mil milhões de euros para apoiar os sistemas de saúde europeus.

Neste esforço europeu, destacam-se o Fundo de Recuperação – dotado de 750 mil milhões de euros – e também o próximo Quadro Financeiro Plurianual, para os quais é obrigatório avançar rapidamente com novos recursos próprios para o orçamento europeu, cuja proposta está retida no Conselho Europeu e para a qual será ainda necessária a ratificação pro parte de todos os Estados-Membros.

A Comissão e o Parlamento Europeu tudo têm feito para garantir que uma resposta robusta seja dada em tempo útil à crise sem precedentes que atravessámos. Mas há miopias e entropias que continuam a condicionar a capacidade de resposta da UE face às legítimas expectativas e sobretudo necessidades dos cidadãos europeus. Trata-se de uma situação ainda mais urgente quando sabemos que as repercussões da atual pandemia têm maior impacto sobre as mais de 109 milhões de pessoas que vivem em risco de pobreza na UE, particularmente no que toca ao acesso a serviços essenciais como a saúde ou a educação e a habitação.

Em Portugal, esse impacto está a fazer-se sentir de forma particularmente grave, a atender pelas denúncias dos profissionais e das organizações de saúde, e sobretudo face aos números crescentes de listas de espera para cirurgias, consultas e exames de diagnóstico.

Para além das incapacidades de resposta para fazer face a um recrudescimento da pandemia em números mais graves do que da primeira vaga de março/abril, o sistema nacional de saúde está a prescindir de serviços básicos e vitais para a população – tanto ao nível do tratamento como de prevenção, diagnóstico e acompanhamento de doenças – cujas consequências acarretam riscos graves para a saúde pública a breve prazo. As taxas de mortalidade podem agravar-se drasticamente decido ao adiamento de diagnóstico em doenças, nomeadamente cancerígenas.

É uma consequência dramática de uma opção de cariz sobretudo ideológico de um governo socialista dominado por uma esquerda que defende a exclusividade do setor público, quando o lema deveria ser o envolvimento de toda a sociedade, de todos os recursos e sinergias de um país unido, em torno de uma causa obviamente comum. É inegável a importância da vacinação da população contra a gripe, mas as farmácias queixam-se da falta de vacinas face à procura, porque o Estado decidiu açambarca–las nos centros de saúde, com dificuldades acrescidas de serviço.

Face à atual ameaça à saúde pública, os setores privado e social representam uma mais valia para, aliada ao insubstituível Sistema Nacional de Saúde, assegurar o serviço de saúde mais adequado às necessidades da população e aos padrões de qualidade de vida que se impõe, numa sociedade desenvolvida e regrada pelos valores humanistas.

Na luta contra a pandemia Covid-19, a Comissão Europeia deu um bom exemplo sobre a importância da mobilização dos setores público e privado, como aconteceu em maio com a campanha global de angariação de fundos para investigação e que em poucas horas logrou atingir os 7,5 mil milhões de euros que eram apontados como objetivo inicial da iniciativa.

Ao invés, o governo socialista de António Costa prefere apostar numa política de serviço público de permanente dependência do Estado, comprovadamente deficitário. Não se compreende o funcionamento de contingência a que se assiste em serviços básicos e vitais, como é a saúde. São precisamente os mais carenciados a sofrerem, por manifesta incapacidade de acesso a sistemas alternativos.

A proposta de Orçamento de Estado para o próximo ano insiste na reiterada opção de subsidiodependência, com o problema agravado nem assim satisfazer os habituais parceiros de esquerda (BE e PCP), preocupados com a colagem a uma governação sobranceira perante as crescentes consequências sociais da atual crise.

Na saúde, o plano assenta em reforços financeiros limitados que vão servir para remediar alguns dos buracos que voltaram a avolumar-se com a governação socialista, ao mesmo tempo que procurará dar sustento a respostas propagandísticas a queixas de diferentes setores profissionais.

De fora fica, novamente, a concretização de uma verdadeira política de modernização e desenvolvimento do setor da saúde em Portugal, a começar desde logo pela articulação e coordenação dos diferentes setores que atuam neste campo, sejam públicos, privados ou sociais.

Como é apanágio socialista, prefere-se a propaganda e a boa comunicação na gestão de expectativas e dos problemas.

António Costa até procurou esta semana desmentir os atributos na comunicação, ao fazer uma espécie de ‘mea culpa’ sobre a obrigatoriedade da aplicação ‘Stay Way Covid’, numa trapalhada tão oportuna como provocada para aliviar tensões sobre a crise económica, social e dos serviços capitais do Estado e, sobretudo, de um orçamento cuja pobreza nem as benesses vindas dos reforçados fundos da UE permitem disfarçar.

Em situação de crise, torna-se ainda mais premente a importância de contar com todos, sobretudo com a sociedade civil, sem exclusão – palavra que a esquerda gosta de usar como princípio da sua doutrina, mas que viola de forma sistemática e reiterada, em prejuízo direto das pessoas.

Gosto

+ Recorrer às artes circenses para promover a integração social é um bom exemplo de inovação e das potencialidades da autonomia dos diferentes agentes que intervêm na sociedade, designadamente ao nível das escolas e formação. O projecto Equilibrium Social Circus nasceu no ano passado na EB2,3 Frei Caetano Brandão, em Braga, resultado de um outro projeto de prevenção desenvolvido em Famalicão. A ideia está a crescer e pode estender-se a diferentes concelhos. É uma valia de que todos beneficiamos.

 

+ A criação e melhoria de trilhos pedestres comprovam que os municípios minhotos estão empenhados na valorização do património natural e histórico desta região. Disso são exemplos o processo de homologação da rede de percursos pedestres de Esposende e os novos trilhos anunciados no concelho de Vila Verde, a juntar à oferta de outros concelhos.  Favorecem a valorização de territórios de baixa densidade e são um bom convite a saudáveis exercícios físicos em espaços rurais, especialmente aconselháveis neste período de recomendações contra aglomerados.

 

+ Em Famalicão, acaba de ser inaugurada a incubadora do Centro de Investigação, Inovação e Ensino Superior, em Vale de S. Cosme. Em Terras de Bouro, o município assume a determinação em utilizar o investimento público como fator de promoção do emprego e da economia. Num período em que se agravam as preocupações sociais e económicas, é especialmente reconfortante saber que podemos contar com a intervenção dos municípios para superar dificuldades e obstáculos, superando mesmo as suas competências se for necessário.

 

Não-Gosto

– O governo lançou há mais de dois anos o “1º Direito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação”. Seria dirigido às famílias mais carenciadas e sem alternativas habitacionais. Uma bela intenção e um excelente anúncio. Mas ficou-se pelos 8% da execução prevista para os dois primeiros anos do programa. Visava resolver o problema a cerca de 26 mil famílias e foram anunciados 700 milhões de euros até 2024. É mais uma demonstração do prejuízo que representa a preferência pela propaganda, em detrimento da ação, designadamente quando se trata de luta contra a exclusão.

 

– Numa altura em que se agravam os riscos de descontrolo da pandemia Covid-19 em Portugal, o governo, e designadamente o Ministério da Educação, continua a ser acusado de “esconder informação”. A acusação vem de especialistas, organizações setoriais e sindicatos, como a Federação Nacional dos Professores (Fenprof) – que garante serem já mais de 330 as escolas em que terá confirmado casos positivos de infeção. Sem confiança, é difícil ganhar esta ‘batalha’.

 

– Guimarães continua sem ligação do alfa pendular. O serviço foi suspenso em março e não há previsão nem esperança que seja retomado. É a confirmação da visão deturpada de descentralização que resulta vocação centralista do governo de António Costa.  Por esta situação podemos ficar a saber o que vale – ou antes do que não vale – a declaração desta semana do primeiro ministro de que o a TAP “não pode ser uma companhia de Lisboa”.