Não há culpa na pandemia Covid-19. Este é um choque simétrico que atinge todos os Estados-Membros da UE. No entanto, os efeitos económicos são assimétricos. Por isso, exige-se uma solidariedade de facto, ações concretas. É necessário recuperar e relançar a economia, evitar o aumento das disparidades regionais, contribuir para a convergência dos Estados-Membros. Se um Estado-Membro não tiver capacidade financeira para apoiar as suas empresas e outros estiverem – como efetivamente estão – a injetar milhares de milhões de euros, haverá uma distorção de mercado. As empresas dos Estados-Membros mais pobres ficam numa situação de ainda maior dificuldade. A solução para a economia tem de ser europeia. Acresce que há países que ficam em risco se tiverem uma maior dívida pública e, no caso de Itália, é a própria zona euro que fica em risco. Se os ditos “frugais” (Holanda, Suécia, Dinamarca, Finlândia, Áustria) não quiserem ser solidários, então que sejam egoístas! É que o desmoronamento da zona euro iria afetá-los-á muito negativamente, até porque são grandes beneficiários do mercado interno.
É urgente recuperar e relançar a economia. As medidas que foram tomadas, em termos de recursos financeiros adicionais, significam empréstimos. Não servem. Defendo um Fundo de Recuperação Económica que se traduza em subvenções (subsídios) e não em empréstimos. A constituição deste Fundo é urgente, não pode ficar à espera da aprovação do Quadro Financeiro Plurianual 2021/2027. A Comissão Europeia pretende criá-lo usando as garantias das margens do orçamento da UE. Assim, poderia ir buscar aos mercados mais de € 320 mil milhões. Até aqui, a solução é pacífica. A Comissão faria assim um empréstimo de longo prazo, a taxas de juro muito baixas, uma vez que o orçamento da UE beneficia de “Triple A”.
O problema surge quando se discute o que fazer com este montante e como pagá-lo. Os “frugais” não querem que este empréstimo seja transformado em subsídios aos Estados-Membros. Mas mais empréstimos não servem Itália nem Portugal. O acordo deverá traduzir-se numa decisão salomónica: metade empréstimos, metade subvenções. A questão de como pagar estas subvenções (em princípio, cerca de € 160 mil milhões) é um outro problema. A Comissão propõe que o pagamento comece a ser feito a partir a partir de 2027, através da criação de novos recursos próprios. A questão dos critérios de distribuição do montante do fundo é fundamental. Recordo que, no Mecanismo Europeu Estabilidade, há uma linha de crédito de € 240 mil milhões. Muito dinheiro que, se limitado a 2% do PIB, representará apenas € 4.000 milhões para Portugal.
A Comissão “vende” este fundo como se correspondesse a um aumento do QFP e o resultado são biliões e biliões que não correspondem à realidade. O Fundo de Recuperação fará parte de um plano que se vai socorrer dos próximos fundos e programas. Haverá uma concentração de montantes em 2021 e 2022, que exige planeamento imediato e não pode prejudicar a qualidade dos projetos. O InvestEU, de que fui negociador, vai ser revisto para poder mobilizar mais de € 1 bilião em investimentos. Mas estamos a falar novamente de empréstimos a taxas de juro baixas. O envelope da política de coesão será concentrado nos dois primeiros anos.
Portugal terá dezenas de milhares de milhões em subsídios (com um cofinanciamento de 100%) e em instrumentos financeiros. Aliás, há cerca de € 13.000 milhões no Portugal 2020 que ainda não foram executados e que agora passam a ter um cofinanciamento a 100%.
É urgente definir o que queremos fazer com todo este dinheiro! Quais são as áreas prioritárias? Quais são os projetos? Quais são os objetivos a atingir? As autarquias e os beneficiários não deveriam ser envolvidos? É urgente responder. Acresce que os setores mais atingidos e as regiões mais pobres deverão ter uma atenção redobrada. Esse é o objetivo principal: compatibilizar a competitividade da nossa economia e o reforço da produtividade com a coesão económica, social e territorial.
Estes milhares de milhões terão de ser bem monitorizados. Os projetos devem contribuir para o combate às alterações climáticas, a agenda digital, a inclusão social, a saúde. Não podemos aceitar projetos megalómanos que se traduzam num fardo futuro. Exigimos um investimento inteligente que tenha em conta as especificidades do território. Portugal não pode ser visto a partir do Terreiro do Paço. Só assim teremos um país coeso, uma economia que se vai recuperar e relançar.
Gosto
• A Comissão Europeia lançou o desafio para uma angariação de fundos a nível mundial para acelerar o desenvolvimento de vacinas e tratamentos para combater o novo coronavírus. Na primeira ronda da Resposta Global ao Coronavírus, foram obtidos 7,4 mil milhões de euros, juntando países e também instituições, empresas e dadores particulares de todo o mundo. O esforço de angariação de verbas vai continuar. O objetivo é também garantir acesso global equitativo às novas tecnologias essenciais de saúde.
Não-Gosto
• O Ministério da Saúde está em falta com os pagamentos às IPSS, desde janeiro. É inaceitável. Quando se impõe um reforço de apoios por força das necessidades acrescidas neste período, o Estado nem os compromissos mínimos cumpre. As instituições particulares de solidariedade social cumprem um papel insubstituível e de valor incalculável. Assumem as obrigações e deveres sociais do Estado. Mas este governo insiste em agravar os problemas financeiros a que vem votando as IPSS.