No mês passado, participei numa conferência sobre o futuro do projeto europeu intitulada “Repensar a Europa”, promovida no Vaticano pela Comissão dos Episcopados da Comunidade Europeia (COMECE). Muito agradeço o convite do Arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga, em nome da Conferência Episcopal Portuguesa.
Tive a oportunidade de refletir e o privilégio de cumprimentar e ouvir o Papa Francisco. A sua palavra e o seu exemplo são importantes na construção de um Mundo melhor. A tolerância, o diálogo, a solidariedade e a partilha são valores cristãos essenciais para se conseguir a paz, o desenvolvimento e a inclusão.
Neste artigo, transcrevo excertos da intervenção do Papa Francisco no encerramento da referida conferência a propósito de ameaças e desafios atuais.
Tenho a convicção de que a eleição de Trump, o Brexit, a tentativa independentista da Catalunha e o regresso do nacionalismo em vários países são exemplos da perda de valores e o resultado do egoísmo. Se a Catalunha fosse uma região pobre ou se o Reino Unido fosse um beneficiário líquido do orçamento da UE, não procurariam a “independência”. Impressiona a irresponsabilidade, a impreparação e a mentira dos líderes políticos do Reino Unido e da Catalunha. Avançam com referendos e depois logo se vê quais são as consequências?
Não sabiam que vivemos num mundo global onde as economias são interdependentes?
Mas este egoísmo, ou nacionalismo, prejudica a economia e mina a paz.
Na UE temos a norte o crescimento da extrema-direita e a sul o crescimento da extrema-esquerda com propostas muito semelhantes. Catarina Martins e Jerónimo de Sousa defendem, por exemplo, que Portugal abandone o euro. Marine Le Pen tem a mesma proposta para a França. Mas como é que Portugal podia abandonar a moeda única? Quanto é que custaria? Que impacto teria em termos económicos?
Não tenho dúvidas que pagaríamos caro essa decisão e que os mais pobres seriam os mais afetados. Não é aceitável haver tanto amadorismo.
Recordo o que disse Papa Francisco: “Os cristãos são chamados a favorecer o diálogo político, sobretudo onde ele esta? ameaçado e onde parece prevalecer o conflito. Os cristãos são chamados a voltar a dar dignidade a? política, entendida como máximo serviço ao bem comum e não como uma ocupação de poder. Isto exige também uma formação adequada, porque a política não e? ‘a arte da improvisação’, mas uma expressão nobre de abnegação e dedicação pessoal em benefício da comunidade. Para ser líder são necessários estudo, preparação e experiência.”
A “América First” de Trump ou a “La France En Premier” de Le Pen ou os orgulhosamente Finlandeses, os “orgulhosamente sós”, trazem ódio e divisão.
Já o tenho dito repetidamente que o “orgulhosamente sós” é um problema, não é uma solução!
Enfatizo as palavras do Papa Francisco: “Não foi por acaso que os Pais fundadores do projeto europeu escolheram precisamente esta palavra para identificar o novo sujeito político que se ia constituindo. A comunidade e? o maior antídoto contra os individualismos que caracterizam o nosso tempo, aquela tendência hoje generalizada no Ocidente a conceber-se e a viver em solidão. Compreende-se mal o conceito de liberdade, interpretando-o quase como se fosse o dever de estar sós, desvinculados de qualquer laço, e por conseguinte construiu-se uma sociedade desenraizada e desprovida de sentido de pertença e de herança. E a meu ver isto e? grave. ”
Haverá algum período da história onde a UE e o mundo não tenham estado em crise?
A UE é vítima do seu enorme sucesso. O objetivo da paz foi de tal forma conseguido que o damos – erradamente- como absolutamente adquirido. Não valorizamos a paz, a liberdade, o estado de direito, o multiculturalismo, a defesa intransigente da dignidade humana. Não temos consciência de que na UE temos a maior economia do planeta, a maior percentagem de despesa em termos de direitos sociais, a maior contribuição para ajuda humanitária e desenvolvimento de países terceiros, mas que só somos 500 milhões, ou seja, menos de 7% da população do planeta.
Sou Português, minhoto e europeu. Não há nenhuma incompatibilidade! Pelo contrário! Somos mais ricos na diversidade. A UE ganha com as diferenças. As diferentes perspetivas enriquecem o debate e trazem melhores soluções. Enganam-se os que consideram que mais partilha significa menos soberania. Numa economia desmaterializada, num mundo global, mais partilha pode e deve significar uma soberania reforçada! Mais integração e mais união significa que podemos harmonizar as diferenças, e não implica tornar tudo igual.
Mais uma vez cito o Papa Francisco: “Responsabilidade comum dos líderes e? favorecer uma Europa que seja uma comunidade inclusiva, livre de um mal-entendido de fundo: inclusão não e? sinónimo de nivelamento indiferenciado. Ao contrário, somos autenticamente inclusivos quando sabemos valorizar as diferenças, assumindo-as como património comum e enriquecedor.“
Acabo com os “tijolos” que o Papa Francisco define como sendo necessários para a construção de um mundo melhor: diálogo, inclusão, solidariedade, desenvolvimento e paz.
Gosto
• A Web Summit junta, pelo segundo ano consecutivo em Portugal, cerca de 60.000 pessoas para ouvir mais de 1.500 oradores, que vão desde António Guterres a Stephen Hawking (ainda que à distância). Prevê-se que este evento não só dê visibilidade internacional a Portugal, pelas melhores razões, mas também traga cerca de 300 milhões de euros para o nosso país.
• Decorre esta semana a COP 23 em Bona, numa altura em que em Portugal os efeitos do aquecimento global se começam a sentir, com uma das piores secas dos últimos anos. É importante que o ambiente esteja no topo da agenda internacional, mesmo que alguns líderes mundiais não estejam a bordo.
Não-Gosto
• Já são 30 os casos identificados do surto legionella no Hospital Francisco Xavier em Lisboa, que já provocou 2 mortes. Esta situação tem que ser investigada, devem ser apuradas as responsabilidades, e se calhar é altura de pensar em aumentar as normas de saúde e segurança, bem como a fiscalização associada.
• A utilização do vídeo-árbitro (VAR) tem causado polémica desde o início, situação que se agrava quando se observa que há clubes claramente prejudicados, como aconteceu com o SC Braga no passado fim-de-semana. Não pode haver dois critérios: um para os ditos “3 grandes” e outro para os restantes clubes. É preciso critérios que garantam igualdade de tratamento. O VAR tem de contribuir para a verdade desportiva.