Artigo de Opinião

O Náufrago

Das eleições legislativas em Portugal, resultou a vitória da coligação Portugal à Frente liderada por Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Um resultado surpreendente para a generalidade dos politólogos, a que se juntou a derrota “impressionante” do PS e de António Costa, reconhecidamente o grande derrotado das eleições do passado dia 4 de Outubro. Para expulsar António José Seguro da liderança do PS por este ter ganho as eleições europeias por “poucochinho”, António Costa venceu o partido prometendo uma maioria absoluta. Partiu para as legislativas com uma vantagem e com condições para uma maioria como nunca antes um líder político teve em Portugal.

Ao perder por muitos nas legislativas, a coerência e o respeito da democracia impunham, logo na noite das eleições, o reconhecimento imediato do falhanço e a natural demissão. Mas António Costa optou por manter-se à frente do PS e, sempre num discurso “redondo”, prometeu a recusa de uma maioria negativa. A “palavra” e o compromisso, mais uma vez, foram desvalorizados por António Costa. Já havia assinado um documento com António José Seguro, “Portugal Primeiro”, que depressa negou e rasgou. Tinha prometido que ficaria na Câmara de Lisboa…

Hoje, torna-se claro que o que está em causa é a sobrevivência política de António Costa, um desiderato que se sobrepõe ao interesse de Portugal e do próprio Partido Socialista. Em evidente oposição à postura do líder político mais votado nas legislativas, Pedro Passos Coelho, que afirmou em determinado momento que “se lixem as eleições”, porque o importante é o interesse de Portugal.

Contrariando toda a tradição e prática democrática – incluindo dos seus antecessores no PS, de Soares a Sócrates, com vitórias com e sem maioria -, António Costa optou por deslumbrar-se com o discurso dos partidos de extrema esquerda para desrespeitar a vontade dos portugueses e tentar uma fraude, mais uma traição: procurar liderar um governo, apesar de ter perdido as eleições. Para isso, fundamenta-se na soma de votos de projetos políticos que são até antagónicos, como são os programas apresentados pelo PS e por CDU e Bloco de Esquerda.

A dimensão desta aberração democrática torna-se ainda mais violenta para partidos que, como o PS, ainda há poucos anos recusaram a legitimidade política a um governo liderado por Santana Lopes, porque não havia sido sufragado como líder nas eleições legislativas, apesar de ter o apoio da maioria dos deputados do Parlamento.

As portuguesas e os portugueses disseram claramente que queriam Pedro Passos Coelho para primeiro-ministro. É essa a sua vontade. Foi também o programa eleitoral da coligação PSD/CDS-PP o mais votado pelos portugueses, pelo que deve ser esse o projecto político orientador da nova legislatura, com as necessárias acomodações, considerando a ausência de uma maioria absoluta e conforme aconselha o respeito pela democracia.

Não tenho dúvidas que o resultado das eleições teria sido bem mais desfavorável para o PS e António Costa, se os portugueses imaginassem a possibilidade de tamanho golpe – o de impedir a formação de governo por parte da força mais votada, mesmo levando em conta que já em plena campanha o líder socialista tenha afirmado que rejeitaria um orçamento da coligação PSD/CDS, ainda antes de o conhecer!

Aparentemente, o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista estão disponíveis para alinhar nesta fraude e já manifestaram apoio a um governo liderado por António Costa.

Os dirigentes da CDU dizem agora que “vale tudo para impedir um governo PSD/CDS-PP” – ou seja, para a tão recusada “maioria negativa”.

Mas há verdades incontornáveis que tornam insanável esta momentânea – e sobretudo oportunista – miscelânea de “esquerdas”, estatutariamente e intrinsecamente tão díspares.

O Partido Comunista Português defende a saída de Portugal da zona euro. Aliás, os seus três eurodeputados propuseram que o orçamento da União Europeia de 2016 financiasse a saída da zona euro de países como Portugal!

O Bloco de Esquerda queria a renegociação da dívida, mas agora diz que já a nega, apoia António Costa e deixa as questões europeias fora do acordo! Mas como é isso possível? Portugal está na União Europeia! Portugal assumiu e tem compromissos a respeitar!

Os que votaram contra todos os orçamentos propostos pelo PS são agora parceiros fiáveis?

Como é possível sustentar esta coligação “contra natura” que já nas eleições presidenciais não se entendem, avançando com uma impressionante diversidade de candidatos próprios? Mesmo depois de António Costa ter começado por apoiar e incentivar a candidatura de Sampaio da Nóvoa como supostamente “unificador” de todas estas esquerdas, preferindo agora desvincular-se de qualquer candidatura “para não ficar comprometido” e evitar mais uma vez apostar num dos “cavalos errados”.

São estas as esquerdas capazes de se unir e manter-se unidas com o PS durante 4 anos?

É nestas condições que o Presidente da República dará posse a António Costa para primeiro-ministro? Será essa a forma de respeitar a vontade dos portugueses? É essa uma solução credível, coerente e estável? ,

O interesse de Portugal está, neste momento, refém do actual líder do Partido Socialista que, por sua vez, tornou-se refém da esquerda radical. Com o partido reconhecidamente dividido, António Costa tem o apoio dos “boys”, dos “interesses”, das figuras do costume. Ainda não perceberam que, mais cedo do que pensam, será o PS a sofrer eleitoralmente pelos ziguezagues e irresponsabilidade da actual liderança. Também ainda não compreenderam que Costa está a fracturar o Partido Socialista, exponenciando as clivagens internas. Mas o maior sofrimento seria – caso tivéssemos esta esquerda a governar – suportado pelos mais pobres, que voltariam a pagar a factura deixada pelos socialistas.

A instabilidade voltou a Portugal, em consequência do interesse pessoal de António Costa.

O líder do PS é um náufrago político que procura a sua sobrevivência, ainda que para isso afunde Portugal.