In revista “Dirigir & Formar” do IEFP
A União Europeia significa valores que temos de fortalecer: desde logo, a Paz, que – erradamente – a damos como absolutamente adquirida, assim como defesa intransigente da dignidade humana, Estado de Direito, democracia, liberdade, solidariedade, igualdade e inclusão.
A UE é também progresso e desenvolvimento. É o melhor local do Planeta para vivermos. Os 450 milhões de habitantes dos 27 Estados-Membros da UE representam menos de 6% da população mundial, estão numa das maiores economias do mundo (a par dos EUA) e acedem a quase 50% da despesa social do mundo. Para além disso, a UE é o maior doador mundial e quem mais ajuda os países em desenvolvimento.
À escala global, vivemos os desafios da globalização, alterações climáticas, migrações, escassez de recursos naturais, demografia. Na UE, enfrentamos um outro desafio – o maior – que é o da natalidade. A segurança energética e o respetivo abastecimento também é um dos desafios. Para vencermos estes desafios, os Estados-Membros têm – em primeiro lugar e no mínimo – de praticar a solidariedade, partilhar, atuar de forma coordenada. A globalização, tal como todos os desafios, também significa oportunidade. Não podemos ter medo do objetivo competitividade, produtividade, empreendedorismo. Promovendo o rigor e o mérito, temos de apostar na investigação e inovação, no reforço das competências, na formação profissional, na educação. Independentemente do sítio onde que se nasça, ou da família de que se provém, há que dar igualdade de oportunidades. Desta forma, teremos um elevador social a funcionar, uma economia e um Estado social forte.
É este o Portugal que quero. Deverá convergir com a UE e ser coeso do ponto de vista territorial, económico e social. Tal exige o fim do centralismo e a redução da burocracia.
Portugal, desde a sua adesão, já recebeu mais de 100 mil milhões de euros em fundos europeus. Nem sempre temos consciência que as estradas onde passamos, a água que bebemos, o tratamento dos resíduos, as creches, jardins de infância, escolas, universidades, a formação profissional, os lares, hospitais e centros de saúde, o apoio às PME, os programas e apoio à juventude têm origem no orçamento da UE. Aliás, em Portugal mais de 80% do investimento público é financiado por fundos europeus.
Quadro 2021-2027
Para 2021-2027, a União Europeia aprovou o novo Quadro Financeiro Plurianual (QFP) com um montante superior a um bilião de euros. Trabalhei neste dossier desde 2017, na qualidade de coordenador do PPE na comissão dos orçamentos e como membro da equipa de negociação. O QFP traduz, em termos financeiros, as prioridades políticas da União Europeia, fixando a duração, os montantes dos limites máximos anuais das despesas, as categorias de despesas, os fundos e os programas. Corresponde apenas a cerca de 1% do PIB da UE, mas tem um enorme valor acrescentado: mais de 93% é dedicado ao investimento. As despesas administrativas e de funcionamento são inferiores a 7% do orçamento.
O novo QFP corresponde a uma diminuição de verbas em relação ao anterior (QFP 2014-2020), mas é compensado e até acrescido pelo Plano de recuperação e resiliência para a Europa – o designado NGEU-Next Generation EU, no valor de 750 mil milhões de euros e que surgiu para dar resposta aos efeitos negativos do ponto de vista económico e social resultantes da pandemia Covid-19. No total, temos um valor superior a 1,8 biliões de euros.
Portugal garantiu para 2021/2027 cerca de 49 mil milhões de euros em subvenções (subsídios a fundo perdido) provenientes do QFP e do NGEU – batizado de “bazuca” pelo primeiro-ministro António Costa.
Nunca Portugal teve acesso a tanto dinheiro. É uma responsabilidade acrescida e uma emergência trabalhar para que as verbas provenientes da UE, e que ficarão sob gestão nacional, sejam bem utilizadas. Para isso, insisto: temos de definir o que pretendemos para o país e por cada região.
É imprescindível envolver as autarquias, as empresas, as universidades e as IPSS. Portugal tem de ser capaz de utilizar estes recursos para aumentar a produtividade, criar emprego e, em simultâneo, conseguir a coesão territorial, económica e social.
Os programas operacionais regionais são essenciais, até porque permitirão também evitar a aplicação discricionária de fundos concentrados em programas temáticos. É impensável recebermos muito mais dinheiro e reduzirmos os programas operacionais regionais.
É um erro grave usar os fundos para pagar despesa corrente. Estes preciosos recursos devem seguir o princípio da adicionalidade, e não podem servir para o Estado se financiar a si próprio. Isso significaria desperdiçar uma nova oportunidade e, mais uma vez, comprometer o futuro do país e das novas gerações.
Há perguntas que se impõem:
- As regiões, os beneficiários, foram ouvidas para a elaboração do acordo de parceria denominado Portugal 2030 e que define a forma como o envelope nacional resultante do QFP (com exceção dos pagamentos diretos aos agricultores) vai ser executado nos próximos 7 anos?
- Teremos programas operacionais reforçados, sobretudo nas regiões mais pobres, designadas por regiões menos desenvolvidas?
- Como é que vai ser a “governança” dos fundos e dos programas? Está a trabalhar-se na simplificação? Os regulamentos específicos vão ter em conta as diferentes realidades e vão estar de acordo com os objetivos pretendidos?
- O Fundo Social Europeu Mais será gerido de forma centralista ou as regiões também o poderão aceder?
- As regiões terão autonomia para, por exemplo, usarem as taxas máximas?
Política de Coesão: emprego e competitividade
A Política de Coesão é a principal política de investimento da União Europeia, correspondendo a cerca de 1/3 do QFP. O principal objetivo da Política de Coesão da UE consiste em reduzir as disparidades económicas, sociais e territoriais significativas que ainda existem entre as regiões da Europa, conforme o art.º. 174 do TFUE. Não conseguir reduzir estas disparidades comprometeria algumas das pedras angulares da União Europeia, nomeadamente o seu mercado único e a sua moeda, o euro.
A Política de Coesão está direcionada para todas as regiões e cidades da UE, com vista a apoiar a criação de emprego, a competitividade empresarial, o crescimento económico, o desenvolvimento sustentável, assim como melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. A execução dos fundos da Política de Coesão impõe o cofinanciamento dos projetos, pelo que assume um efeito catalisador do investimento público e privado, reforçando simultaneamente a confiança dos investidores.
A Política de Coesão é constituída pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), pelo Fundo Social Europeu (FSE) e pelo Fundo de Coesão (FC).
O FEDER e o FC contribuem para o emprego, ao dinamizarem o crescimento económico. O FEDER deverá igualmente apoiar a inovação, a investigação, o objetivo das alterações climáticas e terá de dinamizar a economia através do apoio às PME e ao empreendedorismo.
O FSE está mais vocacionado para os objetivos na área do emprego, educação e inclusão social. O apoio prestado através da Política de Coesão vai continuar a ser gerido através de gestão partilhada entre a Comissão Europeia e os Estados-Membros (exceto o Mecanismo Interligar a Europa, que tem uma gestão centralizada), condição indispensável para obter cofinanciamento.
Com meio século de vida, o Fundo Social Europeu é um dos instrumentos mais emblemáticos da construção europeia. Está orientado para as pessoas e a coesão social. É um fundo estrutural da UE e um instrumento permanente da estratégia para promover o emprego e a mobilidade geográfica e profissional dos trabalhadores na Comunidade.
Face aos desafios que a União Europeia, os Estados-Membros e os cidadãos têm pela frente – desde o crescimento demográfico e o envelhecimento da população, à globalização, escassez de recursos, alterações climáticas e implantação da economia verde, domínio das novas tecnologias, investigação e inovação –, o FSE cumpre um papel cada vez mais decisivo para a qualificação dos recursos humanos. Foi e é decisivo para mulheres e homens, jovens e idosos, pessoas de diferentes origens e grupos étnicos, pessoas com deficiência e outros grupos desfavorecidos.
Fundo Social Europeu+
No atual QFP 2021/2027 passaremos a ter o Fundo Social Europeu+ (FSE+). O FSE+ estará ligado ao Pilar dos direitos sociais e irá investir na educação, formação e aprendizagem ao longo da vida, na inclusão social e na eficácia dos mercados laborais e igualdade de acesso a empregos de qualidade.
Assim, o FSE+ continua a ter como objetivo reforçar a coesão económica e social, através do apoio à promoção do emprego; investimento nas qualificações, na educação e na aprendizagem ao longo da vida; inclusão social e luta contra a pobreza; reforço das capacidades institucionais e da eficácia da administração pública.
O Parlamento Europeu e o Conselho chegaram a acordo em fins de 2020 relativamente ao regulamento do FSE+, que é o resultado da fusão da Iniciativa Emprego Jovem, Fundo Europeu de Ajuda às Pessoas Carenciadas, Programa para o Emprego e a Inovação Social e do Programa de Saúde da UE. O montante do FSE+ será de 88 mil milhões de euros a preços de 2018. Nos termos do acordo resulta que:
– Os Estados-Membros que tenham taxa superiores à média da UE, ao nível do desemprego jovem e dos jovens que não trabalham, não estudam nem estão numa formação, devem atribuir 12,5 % do FSE+ para ajudar estes jovens a encontrarem uma qualificação ou um emprego de boa qualidade. Os outros Estados-Membros devem afetar um montante adequado dos seus recursos do FSE + a ações específicas de apoio a medidas de emprego dos jovens;
- Os Estados-Membros têm de afetar, pelo menos, 25 % do FSE+ à promoção da inclusão social;
- Todos os Estados-Membros têm de afetar, pelo menos, 3 % do FSE+ para o fornecimento de alimentos e assistência material de base às pessoas mais carenciadas;
- Os Estados-Membros com um nível de pobreza infantil acima da média da UE devem consagrar pelo menos 5 % do FSE+ à resolução deste problema. Todos os outros Estados-Membros devem afetar um montante adequado dos seus recursos do FSE+ a ações de combate à pobreza infantil;
- O FSE+ apoiará a inovação social, a nível da UE, com uma dotação financeira específica de 676 milhões de euros.
É ainda de realçar que o FSE+ vai promover o envolvimento das autoridades públicas, dos parceiros económicos e sociais e das instituições da economia social nas diferentes fases da sua execução.
Para 2021/2027, Portugal receberá um montante de cerca de 23,6 mil milhões de euros, a preços correntes, para a Política de Coesão (neste montante está incluído o financiamento do Mecanismo Interligar a Europa e da Cooperação Transfronteiriça). Do FEDER teremos cerca de 11,5 mil milhões de euros, do FC teremos 4,5 mil milhões de euros e do FSE teremos cerca de 7,5 mil milhões de euros, tudo a preços correntes.
Espero que o novo FSE+ seja gerido em Portugal de forma simples e que as regiões tenham o FSE+ incluído nos seus programas regionais.