A Comissão Europeia (CE) apresentou uma tímida proposta de revisão do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021/2027 e o pacote de novos recursos próprios para financiar o orçamento. Uma proposta onde há – apenas – um reforço dos montantes para o apoio à Ucrânia, dos valores destinados ao pagamento da dívida do NextGenerationEU (NGEU) – que deu origem aos PRR de cada Estado-membro – e pequeníssimos reforços para o cumprimento do objectivo da autonomia estratégica da UE.
Esta revisão do QFP é consequência do aumento dos juros relativos à dívida resultante do NGEU, um aumento que deixou o orçamento comunitário em total asfixia. A previsão inicial dos custos dos juros era de 15 mil milhões de euros para 2021/2027 e agora, com o aumento das taxas de juro, poderá chegar aos 30 mil milhões de euros.
A partir de 2027, e até 2058, teremos de pagar os juros e as amortizações. Se, no próximo QFP, se mantiver um orçamento com um limite de 1% do RNB e caso o pagamento da dívida continue dentro do orçamento, seremos forçados a cortar cerca de 20% nos próximos fundos e programas. Tal significaria que os PRR corresponderiam a uma solidariedade nula, uma vez que se recebe agora para se cortar no futuro. Para Portugal, um país extremamente dependente do orçamento europeu, onde mais de 85% do investimento público é financiado pelo mesmo, este cenário será um desastre.
A CE, na proposta de revisão apresentada, não resolveu este erro. Mantém os 15 mil milhões de euros para pagamento da dívida no orçamento e coloca acima dos plafonds para não ultrapassar o 1% do RNB e agradar aos frugais. Assim, acrescentou um montante adicional de 15 mil milhões de euros para fazer face exclusivamente ao aumento dos juros.
A dívida tem de ser paga e não queremos reduzir o orçamento. Há dois caminhos possíveis: aumentar as contribuições dos Estados-membros para o orçamento, o que sobrecarrega os cidadãos, ou aprovarmos novos recursos próprios. Esta segunda opção é a solução que tenho defendido como co-relator permanente dos recursos próprios da UE.
A CE propõe reajustamentos nas propostas de novas receitas baseadas no Mecanismo de Ajustamento de Carbono nas fronteiras (com um potencial de receita de 1.500 milhões de euros/ano), no alargamento do mercado de licenças de emissão (prevendo-se que, a partir de 2024, gere receitas na ordem dos 7 mil milhões de euros/ano, um montante que aumentará para cerca de 19 mil milhões a partir de 2028) e nas contribuições das multinacionais com base no acordo do 1.º pilar da OCDE (entre 2.500 e 4 mil milhões/ano). A CE propõe ainda um novo recurso próprio ligado às empresas, um recurso estatístico que não é um imposto nem aumentará os custos às empresas. Trata-se de uma contribuição paga pelos Estados-membros que corresponde a 0,5% dos lucros arrecadados pelas empresas e pelo sector financeiro.
As novas receitas não podem penalizar os cidadãos e devem contribuir para os objectivos políticos da UE, para a justiça fiscal e para uma concorrência justa. É urgente avançar com o processo de implementação de novos recursos, que se revela um autêntico calvário: a CE faz a proposta, o Parlamento Europeu dá uma opinião não vinculativa, o Conselho decide por unanimidade e os parlamentos nacionais ratificam.