In Jornal de Negócios, 23/11/2022
JOANA ALMEIDA
joanaalmei da@negocios.pt
O eurodeputado social-democrata José Manuel Fernandes é o redator do parecer favorável do Parlamento Europeu às três novas fontes de financiamento da UE e de um relatório de iniciativa, no qual alerta para a “pressão” orçamentalcriada pela emissão de dívida conjunta. Ao Negócios, explica que a reforma dos recursos próprios da UEganhou urgência com a dívida da bazuca e diz que, com os novos recursos, será possível reduzir as atuais contribuições nacionais e acabar com a “injusta distinção” entre quem contribui mais do que beneficia e vice-versa.
A reforma dos recursos próprios da UE é um tema que se arrasta há vários anos. O que explica a sua urgência atual?
Sempre quisemos novas lectitas.para evitar a injusta distinção entre os beneficiários e contribuintes líquidos. Os Estados-membros são todos beneficiários do orçamento e beneficiam também do mercado interno. E os frugais, que mais se queixam das contribuições que fazem, são os que mais lucram com a UE. Para evitar que um ou dois países se sintam donos do orçamento e diminuir as contribuições nacionais queremos genuínos recursos próprios. Agora há uma urgência nestes recursos próprios porque temos uma dívida para pagar.
Falamos da dívida criada pelo programa de apoio à retoma pós-pandemia. Que implicações trouxe?
Dos 800 mil milhões de euros do NextGenerationEU, 420 mil milhões são subsídios, que dão origem às subvenções dos Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) e também reforçaram programas como o InvestEU ou o Horizonte Europa. Destes 420 mil milhões de euros, 380 mil milhões são para os PRR.E essas subvenções serão pagas pelo orçamento da UE até 2058. De 2021 a 2027, só paga juros e, depois de 2027, serão 15 mil milhões por ano, no mínimo. Neste momento, já são até mais 16 mil milhões por ano, o que corresponde a10% do orçamento da UE. Se não tivermos novas receitas, estamos a sobrecarregar as gerações, o que é inaceitável, ou a cortar programas que são essenciais para Portugal, como a política de coesão, o que também não é aceitávelE a política de coesão representa 90% do investimento público em Portugal, o que significa que, por outro lado, o nosso Oramento é o que menos aposta no investimento público na UE.
Comissão já avançou com a proposta de criação de três novas receitas. Quando se prevê que entrem em vigor?
Há um calendário definido e um princípio: as novas receitas devem ser suficientes para pagar a dívida que o orçamento assume. Ou seja, o novo conjunto de receitas deve estar pronto em 2027e ter, no mínimo,15 mil milhões de euros. Isso está no acordo interinstitucional entre a Comissão Europeia, o Parlamento Europeu e o Conselho. Até 2023, devem estar aprovados os recursos próprios novos: o mecanismo de ajustamento de carbono nas fronteiras, o alargamento do mercado de licenças de emissão e os contributos das multinacionais. Mas este é um processo moroso, porque tem de ser ainda aprovado no Conselho por unanimidade e ratificado nos Parlamentos nacionais. O limite é entrarem todas em 2027 para o orçamento não ser cortado nem haver uma sobrecarga dos cidadãos. Normalmente, a alteração da decisão de recursos próprios demora mais de dois anos.
A Comissão já está também a trabalhar num segundo cabaz de receitas. Quanto é que se espera arrecadar?
Quando dissemos que as receitas têm de ser suficientes para pagar a dívida, é fácil quantificar. São cerca de 15 mil milhões. Mas não queremos só receitas para pagar a dívida. Queremos também receitas para pagar todos os encargos que resultam da utilização da garantia do orçamento, como os empréstimos à Ucrânia, e dar autonomia estratégica à UE. A Comissão veio propor a criação de um fluidopara a soberania estratégica da UE e há projetos comuns necessários, na área da energia, criação de chips, segurança online. O financiamento de tudo isso queremos que resulte da iniciativa dos recursos próprios.
A criação de uma taxa sobre transações financeiras poderá ser um dos novos recursos próprios que a Comissão irá apresentar. Que outros poderão vir a ser anunciados?
No Parlamento, eu e a minha
colega Valérie Hayer, que somos os responsáveis permanentes pela receitas do orçamento, vamos avançar com um novo relatório para introdução de novas receitas. Neste momento, ainda estamos a trabalhar nessas novas receitas, mas todas estas novas receitas têm um objetivo: nãopenalizar o cidadão europeu. A criação de tuna taxa sobre os biorresíduos será possivelmente uma nova receita. Porquê? Porque não queremos que os alimentos sejam depositados em aterro. Estas receitas também têm um objetivo de mudar comportamentos, de ajudar a combater as alterações climáticas e o de termos não só uma justiça fiscal,mas uma concorrência leal.
Esse relatório será apresentado ainda antes da proposta da Comissão?
Em março, vamos votar este relatório. O Parlamento irá propor o segundo pacote de receitas na segunda metade de 2023. A nossa estratégia é a proatividade. É influenciar, dar sugestões, incluindo à Comissão Europeia. A Comissão Europeia virá depois de junho de 2023 com uma nova proposta