Entrevista revista Exame (Dezembro de 2023)
Novas formas de financiamento e uma maior união entre os países são as propostas de José Manuel Fernandes para ‘salvar’ a Europa.
O eurodeputado eleito o quarto mais influente dos 705 eleitos no Parlamento Europeu num ranking elaborado pela BCW EU Influence Index, defende que a Europa tem de encontrar formas de se refinanciar para ter verbas para continuar a apostar nas políticas comuns. O “alargamento do mercado de licenças de emissão, o ajustamento da taxa de carbono nas fronteiras e uma taxa sobre as grandes multinacionais e sobre as transações financeiras” são as propostas do eurodeputado José Manuel Fernandes, membro da Comissão dos Orçamentos e do Sistema de Recursos Próprios da União Europeia para equilibrar as contas europeias.
“Uma parte dos impostos que já são pagos pelas grandes multinacionais deve vir para o orçamento da União Europeia porque nós também temos que ter receitas para combater a fraude e a evasão fiscal”, afirmou o político. “Só em fraude, evasão e elisão fiscal perde-se, anualmente, o equivalente a 7 orçamentos da União Europeia” frisa José Manuel Fernandes. “Temos de falar de uma taxa sobre as transações financeiras, que podia dar 30, 40 mil milhões de euros por ano e que ainda não existe” e que, na prática, “pode diminuir os lucros dos bancos a nível da União Europeia”, mas, na opinião do político, traria mais justiça às contribuições. “Os princípios são simples e assentam em novas receitas que não penalizem os cidadãos, mas que, implicam que quem ainda não paga, comece a pagar”, contribuindo para uma maior uniformidade fiscal.
MILHÕES PARA “NECESSIDADES IMPREVISTAS”
Com a luz verde dada pelo Conselho Europeu ao projeto comum do orçamento geral da UE para 2024 que disponibiliza 360 milhões de euros para reagir a necessidades imprevistas e que reflete prioridades da UE, incluindo a recuperação económica e as transições ecológica e digital constituindo uma resposta ao atual contesto geopolítico, o eurodeputado defende novas formas de financiamento urgentes. “O orçamento disponibiliza 50 mil milhões para a Ucrânia e 60 milhões para Erasmus. Por um lado, a Europa está a ajudar a reconstrução de um país e, por outro, está a garantir a formação de jovens, mas só o faz porque há dinheiro e é preciso garantir que continuará a haver verbas”, explica, destacando ainda o apoio aos jovens agricultores e os programas na área do ambiente. Este é o quarto orçamento anual no âmbito do orçamento de longo prazo da UE, o quadro financeiro plurianual (QFP) para 2021-2027 e que é complementado por ações de apoio à recuperação após a COVID-19 no âmbito do Instrumento do NextGenerationEU, o plano de recuperação da UE na sequência da pandemia.
“A grande prioridade é a revisão do Quadro Financeiro Plurianual que está a rebentar pelas costuras e que, se nada for feito, não vamos ter dinheiro suficiente para pagar os encargos que vêm dos Planos de Recuperação e Resiliência”, afirma. Para José Manuel Fernandes foi “uma opção errada pôr o pagamento da dívida dos PRR’s dentro do orçamento. Aqui, “mais uma vez os Estados-membros tiveram falta de visão”. “Tudo isto são empréstimos que se vão arrastar até 2058 e, só até 2027, vamos pagar 15 mil milhões só de juros”, não havendo outros recursos para esta despesa.
Sem impostos europeus, para que uma nova tributação seja aprovada, tem que haver unanimidade no Conselho. Segue-se a retificação em todos os parlamentos nacionais, mas basta um parlamento não aceitar a criação de uma nova taxa para a medida não entrar em vigor. “Se um Parlamento Nacional disser que não, já não há nenhuma nova receita para os outros todos”, afirma ao eurodeputado.
MERKEL E VAN DER LEYEN LÍDERES DA EUROPA
A “falta de união entre os estados” e a existência de “governantes, mas não de líderes” são alguns dos problemas que a Europa enfrenta. “Tivemos a Ângela Merkel que arrastava os outros para soluções e para compromissos. Neste momento, esse arrastamento é feito por outra mulher, que é senhora Van Der Leyen e é ela que lidera a Europa”, frisa José Manuel Fernandes para quem a União nunca pode perder como referência “os valores europeus” não podendo também “dá-los como totalmente adquiridos”.
“CADA VEZ MAIS É CERTO QUE A UE TEM DE TER UMA UNIÃO DA DEFESA PARA FAZER FACE ÀS AMEAÇAS, MAS HÁ PAÍSES QUE SE RECUSAM A ACEITAR O ÓBVIO.”
A união entre os Estados foi “fundamental para o combate à pandemia e para a compra comum de vacinas para a Covid 19”, contudo, afirma o eurodeputado, já não é visível em áreas como o fornecimento de energia, a saúde, proteção civil, rede ferroviária e na criação de “uma exército comum”. “Cada vez mais é certo que a UE tem de ter uma União da defesa para fazer face às ameaças, mas há países que se recusam a aceitar o óbvio.”, refere. E avisa: “as democracias ou se unem, ou então estão sob um ataque permanente”.
Outro ponto de união, para José Manuel Fernandes, seria o combate aos incêndios. “É melhor em termos operacionais e fica mais barato ter unidades de combate aos incêndios num sítio central da União Europeia, do que em cada um dos Estados Membros”, afirma.
As posições de José Manuel Fernandes e o trabalho realizado nos organismos da União Europeia e em representação do Parlamento Europeu fizeram com que fosse reconhecido entre os 705 eurodeputados. O BWC EU Influence Index ranking de membros do Parlamento Europeu que mede a influência dos eurodeputados, nomeadamente na “capacidade do decisor político para influenciar a legislação, moldar a agenda política, ganhar votos e garantir posições de poder institucional”.