A floresta é uma competência de cada Estado-Membro. No entanto, tem sido o orçamento da UE o financiador de apoios para a floresta, designadamente através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Rural (FEADER). Estou certo que, se fosse uma competência da UE, teríamos menos incêndios, mais resiliência e mais rentabilidade para os produtores florestais. É inacreditável, mas ainda não temos um cadastro florestal. É evidente que é impossível gerir-se o que não se conhece. O mínimo que se exigia é que o orçamento do Estado já tivesse financiado, há muito tempo, a execução desse imprescindível cadastro.
Ciclicamente, os incêndios têm como consequência a perda de vidas humanas, a que se adicionam danos ambientais e patrimoniais. A prevenção é a melhor solução, face aos fenómenos climáticos extremos cada vez mais recorrentes. Mas a prevenção implica planeamento, investimento e uma gestão florestal – que não existe. A situação agrava-se quando temos um governo centralista, a que acresce o defeito de “gerir” a pensar nos votos. É por isso que o mundo rural tem sido cada vez mais desconsiderado. Aliás, a tendência do governo de António Costa é a de olhar apenas para o Estado e para as duas grandes áreas metropolitanas, como mais uma vez demonstra a proposta do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
A floresta tem de ser vista na perspetiva ambiental, económica e social. Não sendo rentável, a floresta não se renova e impede que os proprietários a possam cuidar. Tenho insistido no estudo da instalação de pequenas centrais de biomassa que pudessem consumir o que resultaria da limpeza das florestas.
A UE definiu uma estratégia europeia para a floresta na procura de coordenação e ações conjuntas. Em simultâneo, pretende-se, à escala global, reduzir a desflorestação e combater a degradação das florestas e o comércio ilegal de madeira.
A superfície florestal da União está a aumentar, nomeadamente em resultado da florestação. As florestas cobrem 40% do território da UE e são um fator importante para a coesão económica, territorial e social, nomeadamente para o desenvolvimento do mundo rural. As florestas ajudam à qualidade dos solos e do ar, ajudam à filtragem e armazenamento de água, sequestram o CO2, combatem a erosão, oferecem produtos como os cogumelos, as trufas e o mel. Note-se que cerca de 23% das florestas europeias estão situadas em sítios da rede Natura 2000, excedendo os 50% nalguns Estados-Membros.
Há que aumentar a competitividade e a produtividade do setor florestal, respeitando a sustentabilidade e a biodiversidade. Para tal, ao FEADER deve juntar-se os fundos da Política de Coesão, o programa LIFE, o programa de investigação Horizonte Europa e o PRR. Aliás, os objetivos ambientais a que nos propomos obrigam a uma aposta na investigação e inovação.
As indústrias florestais da UE apoiam mais de 3,6 milhões de postos de trabalho e geram um volume de negócios superior a 640 mil milhões de euros.
As diferenças entre as florestas europeias implicam “receitas” diferentes, mas cumprindo-se sempre o objetivo ambiental, económico e social. Na UE, há 16 milhões de proprietários florestais privados, que possuem cerca de 60% das florestas. Mas as diferenças em termos do tipo de propriedade são enormes consoante os Estados-Membros e até as regiões. Note-se que o tamanho médio das florestas de propriedade privada é de 13 hectares, mas cerca de dois terços dos proprietários florestais privados possuem menos de 3 ha de floresta.
Em Portugal, a floresta ocupa mais de um terço do território nacional, com uma extensão superior a três milhões de hectares. Mas é um dos países do mundo que mais floresta tem perdido. Dados da FAO, do Eurostat e da Global Forest Watch (GFW) apontavam que Portugal, em 2015, era o quarto país do mundo com maior taxa de desflorestação. As estatísticas de uso e ocupação do solo do INE referem que no período 2015-2018 houve uma perda de 1,6 mil hectares de floresta. Às perdas provocadas pelos incêndios, acumulam-se as transferências para áreas agrícolas e territórios artificializados. A situação é ainda mais preocupante quando constatamos que a resposta à iniciativa legal de obrigar à limpeza de terrenos, após as tragédias dos incêndios de 2017, tem privilegiado a devastação.
No parque florestal português, destaca-se a presença do eucalipto: apesar de mal-afamado e de campanhas públicas para a sua substituição, é a espécie que ocupa maior área de exploração florestal, superando o pinheiro-bravo e o sobreiro entre as espécies mais expressivas. É uma demonstração da importância da rentabilidade para a gestão florestal. Embora sem acesso a apoios públicos – com inclusão da respetiva burocracia que os proprietários florestais denunciam -, a produção de eucalipto beneficia de uma dinâmica comercial mais forte por influência do setor industrial da celulose, papel e cartão.
Num país em que 98% da floresta é propriedade privada, seria de esperar que o Estado cumprisse a sua missão, neste caso demasiado facilitada. Mas a situação do emblemático Pinhal de Leiria é bem elucidativa do falhanço do Estado neste setor: limita a prevenção a meios de combate a fogos e limpeza, insiste em não avançar com o cadastro florestal, anuncia mas não efetiva medidas para promover espécies autóctones, não cria estruturas de apoio que incentivem, por exemplo, a certificação. Faz mais a indústria papeleira que oferece adubo para os produtores de eucaliptos.
O sucesso de qualquer estratégia de gestão florestal está dependente de políticas que alterem o paradigma ideológico sobre a floresta. Não pode ser uma fonte de despesa, trabalho e encargos permanentes, mas antes uma oportunidade de investimento com potencial económico que se aproxime do impacto e da importância que, cada vez mais, tem sobre o Planeta e a qualidade de vida.
Gosto
+ A Associação Florestal do Cávado reforçou os recursos disponíveis para o trabalho de prevenção e limpeza que desenvolve na região. Presidida pelo autarca Carlos Cação, está dotada de uma equipa técnica com capacidade empreendedora e trabalho de relevo na sensibilização e apoio aos proprietários na gestão florestal. Recuperou a sustentabilidade e a credibilidade da associação, com maior número de equipas de sapadores florestais no país.
+ O presidente dos Estados Unidos participa na reunião do Conselho Europeu que arranca hoje, por videoconferência. Os líderes dos 27 Estados-Membros vão abordar com Joe Biden assuntos como as respostas à pandemia de Covid-19, a situação no Mediterrâneo Oriental e as relações com a Rússia. Depois do afastamento no mandato Trump, é mais um passo na retoma da relação transatlântica UE/EUA, de que Portugal é grande interessado.
Não-Gosto
– A execução do Portugal 2020 é de apenas 63%, ou seja, há ainda cerca de 10 mil milhões de euros por executar. São fundos estruturais que recebemos no âmbito do quadro financeiro 2024-2020. Nos tempos de dificuldades acrescidas, tal é incompreensível, até porque as regras foram flexibilizadas e, desde de julho de 2020, o cofinanciamento europeu pode ser de 100%. Até parece que somos um país rico e não precisamos deste dinheiro.
– Portugal vai pescar em 2021 menos bacalhau em águas da Noruega: a quota nacional de 2.607 toneladas passa para 2.274 toneladas. É o resultado de um acordo entre a União Europeia, Reino Unido e Noruega. O anúncio foi feito pelo ministro do Mar. É a prova de que o impacto nas pescas portuguesas por causa do Brexit não são os ridículos três euros que a Comissão propõe, porque considera que Portugal não é afetado nas pescas pelo Brexit!