Esta semana, no Parlamento Europeu, aprovámos o Regulamento que cria o Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR): a fatia de leão da “bazuca” de 750 mil milhões de euros, segundo o batismo do primeiro-ministro António Costa. O MRR é constituído por 390 mil milhões para empréstimos – numa base voluntária – aos Estados-Membros (EM) e 312,5 mil milhões de euros em subvenções. A Portugal, a preços constantes de 2018, dará 13,2 mil milhões de euros em subsídios e disponibilizará 15,4 mil milhões de euros em empréstimos.
É urgente que estes recursos financeiros cheguem à economia, às PME. Tudo está nas mãos dos Estados-Membros. A Comissão só pode ir aos mercados buscar os 750 mil milhões de euros depois da ratificação da decisão relativa aos recursos próprios por parte de todos os países – na generalidade dos casos, a respetiva Constituição exige votação dos Parlamentos Nacionais. Para já, só Croácia, Chipre, Eslovénia e Portugal deram luz verde.
O MRR visa apoiar reformas e investimentos dos Estados-Membros para mitigar as consequências económicas e sociais da pandemia e tornar as economias da UE mais fortes e resilientes. Os projetos a financiar têm de estar aprovados até 2023 e executados até 2026.
Os investimentos feitos ao abrigo do MRR serão estruturados em 6 pilares: ambiente; digital; competitividade económica; coesão social e territorial; saúde e resiliência institucional, económica e social; e políticas para os jovens. Do orçamento do Mecanismo, 37% será destinado a políticas que contribuam para o combate às alterações climáticas e 20% à transição digital.
Nas negociações, insisti, com sucesso, na possibilidade de cada país utilizar um montante do seu envelope para colocar no InvestEU, de forma a poder, nomeadamente, criar um instrumento nacional para a solvabilidade das PME. Com esse objetivo, nos termos do Regulamento aprovado, Portugal pode destinar 4% do respetivo envelope. Portugal vai aproveitar esta possibilidade? Seria criminoso não o fazer.
A avaliação e a aprovação dos planos de recuperação abrangem vários critérios. No caso de um plano não receber classificação “A” nalguns desses critérios, não poderá ser aprovado pela Comissão. Deste modo, os planos devem, por exemplo, contribuir para reforçar o crescimento, a criação de emprego e a resiliência económica, institucional e social do país, prevenir, detetar e corrigir a corrupção, a fraude e os conflitos de interesses na utilização dos fundos, conter medidas que contribuam efetivamente para a transição verde, incluindo a biodiversidade, bem como medidas que apoiem a transição digital.
O governo português tem afirmado que já entregou a sua proposta de plano. Não pode ser! É que, segundo o Regulamento aprovado, as regiões, o poder local e os parceiros sociais devem ser ouvidos e envolvidos na elaboração da proposta do plano. Tal não aconteceu. Espero que o governo arrepie caminho, caso contrário a Comissão não poderá dar a sua aprovação e o Parlamento dará seguramente um parecer negativo.
Afinal, porque é que o governo não quer ouvir as CCDR, os autarcas, as IPSS, as empresas e sobretudo as PME, os agricultores e os pescadores? Será que quer diminuir os programas operacionais regionais e centralizar a gestão dos fundos? Seria impensável Portugal receber mais fundos e as regiões receberem menos!
O Regulamento que estabelece o Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021/2027 está publicado desde 22 de dezembro de 2020. A esmagadora maioria dos regulamentos dos fundos já está aprovada. Por isso, há que articular o acordo de parceira denominado Portugal 2030 com o plano nacional de recuperação e resiliência, criando sinergias e complementaridades. Portugal já começou a negociar com a Comissão Europeia o acordo de parceria denominado Portugal 2030. Mais uma vez, as regiões, o poder local, os parceiros sociais e os beneficiários não foram envolvidos!
Portugal nunca recebeu tantos recursos financeiros da UE. O Portugal 2030, os pagamentos diretos aos agricultores e o MRR somam quase 50 mil milhões de euros a fundo perdido. Esta é a oportunidade para responder à crise provocada pela pandemia e tornar Portugal num país mais competitivo, coeso e resiliente.
O governo de António Costa planeia escondido, negoceia em segredo, gere em surdina. Um dos objetivos é o de se financiar a si próprio, esquecendo que todos estes fundos têm de seguir o princípio da adicionalidade. Há que arrepiar caminho. Ainda vamos a tempo.