A economia social é essencial para a inclusão e para a coesão social e territorial. Mas não basta. No centro da sua ação, na sua génese e motivação, temos de assumir a defesa intransigente da dignidade humana. Os valores da solidariedade, da partilha e do amor ao próximo deverão imbuir toda a atuação da economia social.
Na União Europeia não há uma definição comum de economia social. Atrevo-me a tentar esboçar uma aproximação. A economia social dá primazia aos aspetos sociais e não tem como objetivo o lucro. Mas procura a sustentabilidade e não exclui a realização de proveitos para os reinvestir – na totalidade – nas respostas atuais ou futuras dedicadas aos seus “clientes”. Assim, os lucros não são para os sócios, os proprietários ou os acionistas. Numa organização da economia social, todos os envolvidos devem participar ativamente no processo de decisão. A partir desta definição, nem todas as instituições particulares de solidariedade social (IPSS) pertenceriam à economia social. Do meu ponto de vista, estar no denominado “terceiro setor” não significa pertencer à economia social. Uma instituição que se limite a executar os acordos que tem com o Estado para prestar serviços sociais está na prática – quase só – a substituir o Estado.
Na verdade, as IPSS são insubstituíveis. Nem sempre temos consciência da mais valia que representam. A proximidade dos dirigentes e colaboradores aos utilizadores contribui para o calor humano, o afeto, que não tem preço.
Na UE, a economia social inclui cooperativas, sociedades mútuas, associações sem fins lucrativos, fundações e empresas sociais. Há mais de dois milhões de entidades da economia social, que empregam mais de 14 milhões de pessoas, representando 10% do PIB. Estas entidades assumem as mais variadas formas jurídicas e operam em setores desde a banca aos seguros, saúde, agricultura, artesanato e serviços sociais.
Podemos dividir os 28 Estados-Membros com base no quadro jurídico em que as entidades da economia social operam. Num primeiro grupo temos países com o nível mais elevado de aceitação da economia social, em que foram desenvolvidas iniciativas destinadas a criar quadros jurídicos abrangentes da economia social, onde Portugal, Espanha, Itália e França estão incluídos. O segundo grupo é composto por países que adotaram algumas disposições legais que abrangem as organizações de economia social, mas que não conseguiram desenvolver uma abordagem normativa sistemática, e inclui, por exemplo, Reino Unido, Dinamarca e Finlândia. O terceiro grupo integrapaíses com um baixo nível ou sem reconhecimento legal da economia social, onde estão países como Hungria, Áustria, Letónia, Alemanha e Holanda.
As entidades da economia social precisam da harmonização do ambiente jurídico europeu. Não faz sentido a fragmentação jurídica existente. Para além disso, devem ter acesso aos fundos europeus e a instrumentos financeiros adequados à sua missão. Felizmente, no Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos, conhecido como Plano Juncker, que tive o prazer de negociar, colocamos o setor social como uma prioridade de financiamento.
Em Portugal, as entidades da economia social são mais de 55 mil, empregam mais de 260 mil trabalhadores e dão um contributo para o PIB na ordem dos 3,8%. Obviamente, não havendo uma definição europeia de economia social, as comparações de dados entre países ficam dificultadas.
As entidades da economia social são um espaço de liberdade que facilita o empreendedorismo, a investigação e a inovação. Estas entidades são essenciais para ganharmos, na UE, o desafio da inclusão e do envelhecimento da população. Para isso, também terão de ser um espaço de humanidade, solidariedade, partilha e voluntariado.
Felizmente, Portugal tem centenas de dirigentes e milhares de voluntários anónimos que servem o outro e todos os dias – gratuitamente – dão o melhor de si próprios, para praticar a solidariedade.
Gosto
• A Real e Santa Casa da Misericórdia de Barcelos está a comemorar os 518 anos de existência. É uma marca memorável de longevidade em Portugal e na Europa, o que valoriza a região e o país pela sua dimensão humanista e pelo papel liderante ao nível da solidariedade e da intervenção social a favor dos mais desfavorecidos e necessitados. A instituição, nomeadamente os seus dirigentes e colaboradores, está de parabéns também pelo reconhecido mérito na qualidade do trabalho que desenvolve a favor dos outros.
• O atual bispo da diocese de Leiria-Fátima, D. António Marto, foi nomeado Cardeal pelo Papa Francisco. É um momento de júbilo também para a diocese de Braga, onde foi Bispo Auxiliar. Conheci-o nessa qualidade, convivi com ele constatando a sua inteligência, alegria e simplicidade. É uma iniciativa do Papa Francisco que reforça a abertura do Vaticano e o reconhecimento do trabalho da Igreja Católica portuguesa face aos desafios do mundo cada vez mais global.
Não-Gosto
• Era mais do que previsível que o presidente/adepto exaltasse sentimentos radicais. A agressão aos jogadores do Sporting foi o resultado dessa forma de gerir. É uma nódoa no futebol nacional que correu mundo e que não se pode repetir. Mas há vários culpados! Desde logo os programas em que os próprios comentadores também são incendiários e quase se agridem. O desporto tem de ser um espaço de formação e de valores.
• Em Itália, temos um governo de dois partidos anti-sistema e antieuropeus. Não vale a pena fazer previsões. A Liga e o Movimento 5 Estrelas acordaram com um programa de governo explosivo: sobem a despesa e baixam os impostos, defendem a aproximação a Putin, avançam com um plano interno securitário brutal, exaltando a legítima defesa para construir mais prisões, endurecer penas para os menores e reforçar a política repressiva contra os migrantes. É o populismo radical.