O governo de António Costa prega o descentralismo, mas pratica o centralismo. A última prova foi a decisão de propor a cidade de Lisboa para nova sede da Agência Europeia do Medicamento (AEM), que vai sair do Reino Unido em virtude do Brexit.
António Costa não lançou nenhum debate e não quis fazer a ponderação de outras localizações. Os critérios gerais ainda nem sequer estavam conhecidos, mas a decisão era que só Lisboa recolhia em Portugal condições para a instalação desta importante agência. O problema torna-se mais grave porque tudo isto é, para muitos, a atitude normal. A argumentação é simples: Lisboa é a melhor localização para tudo, porque é onde já está tudo!
O centralismo alicerçado neste pensamento prejudica Lisboa e Portugal. Já o disse várias vezes e repito: Portugal prega na UE – e bem – a necessidade de coesão social, económica e territorial, mas não a pratica no seu próprio território!
Por uma questão de óbvio interesse nacional, nada se tem a opor e todos os portugueses devem unir-se quando Portugal avança com uma candidatura no contexto europeu que representa uma enorme mais-valia para o país.
Mas o mesmo não pode dizer-se quando a formalização dessa candidatura põe precisamente em causa o interesse nacional, hipotecando simultaneamente as já difíceis possibilidades de sucesso da candidatura portuguesa, num processo que envolve os 27 Estados-Membros.
A opção cega por Lisboa revela uma natureza de tal maneira centralista do atual governo que constitui mesmo um argumento negativo para a candidatura de Portugal, considerando o critério da descentralização que preside à iniciativa da União Europeia em distribuir pelo território europeu este tipo de organismos e agências europeias.
O critério da distribuição geográfica (geographical spread) é, aliás, um dos mais relevantes para a escolha do local.
Acontece que Lisboa é já sede das duas agências europeias sediadas em Portugal: o Observatório da Droga e da Toxicodependência e a Agência Europeia de Segurança Marítima.
Com a excepção de Bruxelas, não há nenhuma cidade europeia com mais de duas agências!
Na distribuição pela Europa, vemos que, das três situadas em França, só uma está em Paris. Alemanha, Holanda ou Itália prescindiram de localizar as ‘suas’ agências nas capitais. E Espanha, em cinco, não tem nenhuma em Madrid, mas sim em Vigo, Alicante, Torrejón de Ardoz, Bilbao e Barcelona.
É evidente que seria melhor a agência dos medicamentos vir para Lisboa do que não vir para sítio nenhum em Portugal. Mas a UE defende o princípio da não concentração de modo a favorecer a coesão social, económica e territorial, ou seja, a candidatura de Lisboa não tem hipótese de sucesso.
Perante esta situação, avancei, conjuntamente com o meu colega Paulo Rangel, com uma petição para que existisse um processo inclusivo, onde outras cidades, como Porto e Braga, pudessem apresentar as suas candidaturas.
No Norte, temos cidades com património edificado de excelência para instalar imediatamente, ou num prazo extremamente curto, os serviços da Agência Europeia do Medicamento.
E também dispomos de infraestruturas de educação para os filhos dos funcionários, oferta de serviços de saúde e de apoio social, oportunidades de trabalho, com indústria de ponta e de investigação com forte internacionalização, universidades de excelência reconhecida internacionalmente, com atividade particularmente especializada na área da saúde – incluindo vários cursos de farmácia em diferentes instituições de ensino superior e os cursos de Medicina nas universidades do Minho e do Porto.
Esta é uma região servida pelo aeroporto Francisco Sá Carneiro, com infraestruturas de fácil e rápido acesso.
É na Trofa que está sediada a BIAL, uma empresa farmacêutica portuguesa com medicamentos em mais de 50 países e referência ao nível da inovação e investigação na saúde.
No Minho, a par da parceria Hospital/Universidade, responsável por quase um terço dos ensaios clínicos que se realizam em Portugal, dispomos ainda do INL – Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia e do Grupo de Investigação 3B’s no AvePark.
O governo acabou por recuar parcialmente: afinal, agora, só Lisboa e… Porto podem apresentar candidatura. Uma mudança de posição que apenas vem reiterar a incapacidade deste governo socialista em encontrar alternativas à obsessão centralista do exercício do poder, vincando incompetência para perceber o real significado e a importância da coesão.
O recuo do governo na opção exclusiva por Lisboa e a admissão da possibilidade Porto não acontecem por uma avaliação ponderada de critérios ou estratégia de desenvolvimento estrutural, mas antes por razões eleitoralistas, face à proximidade das autárquicas. A prova é que foi o candidato do PS à Câmara do Porto que procurou capitalizar o recuo do governo.
De fora das opções nacionais anunciadas por ‘decreto’ governamental, voltou a ficar Braga. Porquê? Porque é que não se permite essa possibilidade? É aceitável o silêncio dos dirigentes socialistas do distrito de Braga relativamente a este assunto? É que, para além de Braga ter condições de sucesso, também seria uma forma de afirmarmos e darmos a conhecer em termos europeus o que fazemos e as nossas mais-valias.
Neste processo, a atitude do governo é cínica. Vai fazer de conta que também defende o Porto. Depois de ter já defendido Lisboa perante as instituições da UE, vai dizer que afinal se enganou e pretende outro local? É evidente que não. O governo vai fazer de conta.
Não-Gosto
• As mortes de Pedrógão Grande revoltam e indignam. Para procurar influenciar, desde há vários anos que tenho intervindo e escrito para a prevenção dos fogos florestais. Todos sabemos que a solução está na prevenção. Mas todos os governos têm falhado. Nem sequer temos um cadastro florestal! Como é evidente, não se pode gerir o que não se conhece!
• Há que valorizar a floresta, o ordenamento florestal e a limpeza. Eu sei que demora tempo e são precisos anos. Mas temos de começar! A grande maioria dos fogos tem origem criminosa. Não podemos ter complacência. Tudo isto são evidências que exigem ação. Acresce que os efeitos das alterações climáticas levam a cada vez mais fenómenos extremos. Não entendo tanta inacção. Não tenho dúvidas que vamos voltar a ter mortes. Se nada for feito do lado da prevenção, teremos enormes desastres e os meios de combate nunca serão suficientes.