Melissa Lopes–01.02.2023
“Completamente imoral”, “impensável” e “um disparate a vários níveis”. É desta forma que o eurodeputado José Manuel Fernandes (PSD) classifica a possibilidade de o Governo meter as verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) a render no banco, para aproveitar o aumento das taxas de juro. Admitindo que tal até possa ser legal, o social-democrata afirma que se trata de “uma habilidade” que transmite em Bruxelas uma “imagem péssima” de Portugal, dando a ideia de que o país não precisa do dinheiro.
“Parecemos um país rico, pois o dinheiro que recebemos dos fundos europeus até dá para ser colocado no banco para pôr a render”, critica em declarações ao NOVO, lamentando que o Governo, em vez de estar “preocupado em fazer chegar o dinheiro rapidamente às famílias e às empresas”, esteja concentrado “em ver como é que o consegue reter para tirar dividendos e lucros, nem que com isso prejudique a economia”.
José Manuel Fernandes vai mais longe ao afirmar que, ao estudar formas de meter o dinheiro do PRR a render, o Governo “mostra um desprezo total pelas empresas, pelas famílias e pelo momento”. O eurodeputado garante também que a possibilidade que o país está a equacionar não está a ser bem vista em Bruxelas (“está a passar a mensagem de que Portugal tem dinheiro a mais, que é um país rico) e que, de resto, foi com “surpresa” que se soube que a hipótese estava a ser estudada. “É uma habilidade que não passa pela cabeça de outros Estados-membros”, frisa, assegurando não ter conhecimento que outro países estejam a ponderar fazer o mesmo.
A intenção do Governo de meter a render as verbas da ‘bazuca’ foi confirmada esta terça-feira ao ECO pelo gabinete da ministra da Presidência, que tem a tutela dos fundos europeus. “Considerando o recente aumento das taxas de juro, estão a ser analisadas as condições e os termos de possíveis aplicações”, confirmou ao jornal fonte do gabinete de Mariana Vieira da Silva.
O eurodeputado eleito pelo PSD recorda que a taxa de execução do PRR é “muito baixa” (cerca de 10%) e acentua que, ao procurar mecanismos de “meter o dinheiro dos cidadãos europeus a render”, o Governo auto-incentiva-se a não o dar logo à economia, contrariando assim o seu propósito. “Daqui a pouco o que faz é dizer: ‘avancem lá com as obras, endividem-se, que nós vamos dar-vos o dinheiro no limite do prazo’”, atira.
Para o eurodeputado, o facto de o Executivo estar a ponderar formas de rentabilizar o dinheiro da ‘bazuca’ é, além de “completamente imoral”, uma “quebra da solidariedade do Governo para com os cidadãos europeus”. “É também, no fundo, um desrespeito por aqueles que estão no terreno e a precisar de recursos financeiros, como é o caso das famílias e das empresas”, acrescenta. No entender do social-democrata, em causa está também um “conflito de interesses”, considerando ser “completamente impensável” que o Estado lucre quanto mais tarde der o dinheiro à economia.
Por isso, o que espera é que o Governo “recue nesta possibilidade” e que “canalize os estudos para que o dinheiro seja bem aplicado e chegue rapidamente à economia. A preocupação não devia ser andar a estudar formas de pôr o dinheiro que recebe da União Europeia no banco a render, devia ser estudar formas para acelerar a execução do PRR e dos seus pagamentos porque a economia precisa muito”, conclui.