No dia 9 de Maio de 1950, Robert Schuman – ministro dos negócios estrangeiros da França – fez uma declaração sempre e cada vez mais atual: “A Europa não se fará de um só golpe, nem de acordo com um plano único. Far-se-á através de ações concretas que levem, antes de mais, a uma solidariedade de facto”.
A solidariedade europeia existe de facto, ainda que nem sempre seja acompanhada da responsabilidade que se exige a quem justamente a recebe. Há Estados-Membros para quem a solidariedade só significa receber. Veja-se a Polónia e a Hungria que recebem importantes recursos do orçamento da União Europeia, mas não estão disponíveis para soluções comuns no acolhimento dos refugiados. Mas também há Estados-Membros que reclamam a solidariedade da UE – e bem- mas que não a praticam internamente.
A ausência de uma correta repartição de recursos que favoreçam a coesão territorial é uma evidência a que assistimos em Portugal. Mas há situações onde a desfaçatez é gritante e revoltante, como aconteceu, muito recentemente, com a utilização do Fundo de Solidariedade por parte do governo socialista de António Costa.
Este fundo da UE serve para a apoiar a recuperação das regiões que são afetadas por uma catástrofe natural de grandes dimensões. Face aos prejuízos decorrentes dos fogos de junho e outubro de 2017, a UE atribuiu 50,6 milhões de euros a Portugal. Fui o relator do Parlamento Europeu para a atribuição deste montante. Antecipando uma possível “habilidade” do governo, apresentei uma resolução para a mobilização do fundo, aprovada por larga maioria, onde destaco o seguinte parágrafo: “Insta os Estados-Membros a utilizarem a contribuição financeira do Fundo de Solidariedade de forma transparente, assegurando uma distribuição equitativa pelas regiões afetadas”.
O objetivo é claro, lógico e justo: as regiões afetadas devem receber de forma proporcional aos prejuízos sofridos. Aliás, na candidatura apresentada por Portugal para a mobilização dos fundos, o montante dos prejuízos apresentados tem um valor superior a 1.450 milhões de euros e corresponde aos prejuízos decorrentes dos incêndios de junho e outubro. Este parágrafo da resolução mereceu alguma estupefação da Comissão. Afinal, era essa a regra que sempre foi utilizada por todos os países e corresponde à letra e ao espírito do regulamento que institui o Fundo de Solidariedade. Mas o governo de António Costa não respeitou nem as populações que sofreram com os incêndios nem a resolução do Parlamento! É mau demais para ser verdade, mas é: Governo desviou mais de metade dos 50,6 milhões de euros da ajuda da UE para si próprio! Na verdade, António Costa reservou 26,5 milhões de euros para a GNR, as Forças Armadas e a Secretaria de Estado da Administração Interna. Será que arderam quartéis e carros do Estado e nós não sabemos?
A outra parte, menos de metade, será destinada aos concelhos, mas só para aqueles onde os fogos ocorreram em outubro! Até Pedrógão Grande fica de fora!
O governo de António Costa está a utilizar o Fundo de Solidariedade da União Europeia, que devia ser destinado à reconstrução das áreas afetadas, para financiar instituições do Estado – que deviam ser financiadas pelo Orçamento de Estado! A solidariedade foi objeto de cativação.
Esta decisão é inédita. Portugal já tinha recebido 83,7 milhões de euros do Fundo de Solidariedade da União Europeia, em três outras ocasiões: incêndios florestais em 2003, cheias e desabamentos de terra na Madeira em 2010 incêndios da Madeira em 2011. Nestes casos, os montantes foram distribuídos de forma proporcional.
O governo tem de recuar!
Não bastava os incêndios que mataram 116 pessoas e arderam milhares de hectares de terreno, casas e fábricas?
O Estado falhou na sua obrigação de proteger os cidadãos. O governo foi incompetente, descuidado e clientelar: meses antes de iniciar a época crítica de incêndios, trocou as chefias da proteção civil com cargos para os seus amigos.
É mais do que evidente que a decisão do governo de ficar com mais de metade do Fundo de Solidariedade demonstra desprezo para com as pessoas que mais sofreram com a tragédia dos fogos, e é injusta, imoral e indigna.
Gosto
• A Vila de Prado, em Vila Verde, recebeu no passado fim de semana o Campeonato do Mundo de Maratonas em Canoagem. Foi um sucesso a nível desportivo e organizativo. Parabéns ao Clube Náutico de Prado, à Junta de Freguesia da Vila de Prado e à Câmara de Vila Verde. Milhares de pessoas assistiram a uma prova extremamente competitiva. Foi um excelente contributo para valorizar a região.
• O SC Braga venceu a Supertaça de Futebol Feminino Allianz, num jogo de grande abnegação e superação frente ao Sporting. Uma vitória histórica e que reforça a dimensão eclética e o palmarés do clube. Esta conquista consolida o nível competitivo e a ambição do SC Braga para a conquista de títulos nas diferentes modalidades.
Não-Gosto
• O caos que se vive na saúde, e em especial nos hospitais públicos, é uma situação inaceitável, com a agravante de se agravar a cada dia que passa com prejuízo direto para os portugueses. Não falta apenas dinheiro para cumprir orçamentos, mas também recursos humanos e equipamentos. É a evidência da falência de um governo que é bom na comunicação, na propaganda, mas que infelizmente falha na ação estrutural e reformista que o país precisa.
• O desinvestimento público está a ter graves reflexos ao nível dos transportes, com particular destaque a nível ferroviário – mais uma das áreas anunciadas como prioritárias pelo atual governo socialista. Além da falta de manutenção e renovação de infraestruturas, na CP faltam trabalhadores e comboios são cada vez mais antigos – tanto regionais como de longo curso. A resposta do governo é anunciar concursos públicos para 20 novos comboios que só chegarão “entre 2023 e 2026”. E sendo que o investimento terá de ser suportado por fundos comunitários.